
Havia a ala tanto de brasileiros quanto de portugueses que estava disposta a abraçar a causa constitucional. Queriam alcançar liberdade civil e ampla. Por isso, saíram do partido português e foram em busca da independência. O movimento nas províncias estava intenso. Estouravam as insurreições. O caso de maior sucesso dessas investidas ocorreu em Goiana, norte de Pernambuco, em 1821.
Durante a revolução em 1817, conforme tratamos em capítulo anterior, Goiana foi o reduto de maior resistência. Em retaliação, o governador Luís do Rego sufocou os goianenses na área comercial, principalmente os artesãos. Devido a essas medidas, um ato de “vingança” quase tirou a vida do governador, quando este foi atingido pelo goianense João de Souto Maior numa ponte do Recife.
As tropas do interior da província se reuniram no movimento que viria a culminar na Convenção de Beberibe. Tudo começou no engenho Tamataúpe de Flores (à época pertencente a Nazaré da Mata, hoje Buenos Aires). O coronel de milícias Manuel Inácio de Melo, assessorado por Felipe Mena Calado da Fonseca, reuniu-se durante dois meses no Engenho Cangaú de propriedade do sargento-mor Joaquim Martins da Cunha Souto. Ali prepararam a conspiração. Juntaram forças com homens das vilas de Paudalho e Limoeiro, e freguesia de Tracunhaém. Leram o manifesto e partiram de Nazaré com cerca de seiscentos homens a pé e a cavalo. Entraram “em Goiana em 29 de agosto de 1821.” (5) Ali as tropas participaram da eleição da primeira Junta com o nome “Governo Constitucional Provisório da Província de Pernambuco, ou Junta Governativa de Goiana.” Seus membros queriam implantar um governo constitucional e expulsar Luís do Rego de Pernambuco. Para tal empreitada, precisavam de homens motivados e resolveram aumentar o soldo dos milicianos para atrair gente do Recife. Em seguida, comunicaram essa eleição ao governador a fim de forçá-lo a aceitar a junta. Para contra-atacar, Luís do Rego formou uma junta chamada “Junta Constitucional Governativa da Província”. Autoproclamou-se presidente da mesma, o que foi rejeitado pelos pernambucanos.
O governador fez ameaças e conseguiu apoio da Bahia. Tentou atrair gente da Paraíba, mas foi em vão. A tropa dos insurgentes saiu de Goiana para cercar o Recife e conseguiu adesão até mesmo dos homens do governador. Em combate contra as tropas do general português, os pernambucanos ocuparam pontos importantes. Cercaram o Recife em 22 de setembro, fecharam a última entrada favorável a Luís do Rego, em Afogados. Sentindo a derrota, Rego propôs um acordo mediado pelo governo da Paraíba. O Termo da Capitulação de Luís do Rego, conhecido como a Convenção de Beberibe, foi assinado no dia 5 de outubro. Um batalhão de Algarve que aportou no Recife para garantir repressão aos pernambucanos se retirou depois de muita luta. O batalhão embarcou em silêncio (6) na madrugada de 30 de novembro de 1821. O momento marca a “libertação do território brasileiro” (7) da presença de Portugal. O governador expulso foi o último português a governar Pernambuco. Barbosa Lima Sobrinho dá à Junta Provisória o mérito dessa conquista presidida por Gervásio Pires. Faziam parte da junta além de Gervásio, Manuel Carvalho, padre Venâncio de Rezende, Frei Caneca e o capitão Barros Falcão.
Apesar de a Junta Provisória quase sempre contrariar a não concessão dos Tribunais existentes no Brasil e de nunca apressar-se a cumprir as ordens das cortes, mantinha uma relação diplomática a fim de preservar os interesses políticos. Em ofício de outubro de 1821, a Junta diz reverenciar “Sua Alteza o Príncipe Regente” e nega desobediência “aos Reais Decretos do Amável Príncipe Regente.” (8) Garante fidelidade e diz não ter “a ousadia de contrariar as Ordens, que dimanam do poder executivo” e atribui a Luís do Rego o descumprimento da promessa de montar uma Junta na província para depois rejeitá-la. Por fim, o ofício explica a adesão e clareza da Junta, e fidelidade à pessoa do Príncipe Regente. O governo do príncipe respondeu dizendo contemplar o documento público e zelar pela “boa ordem” e a “união fraternal das Províncias do Brasil.” Disse reconhecer ainda “os sentimentos patrióticos dos distintos membros da “Excelentíssima Junta Provincial do Governo da Província de Pernambuco” (9).
Gervásio Pires, ex-revolucionário de 1817, eleito presidente da Junta, passou a governar a província. Representava uma conquista dos pernambucanos, recompensa pela luta em busca da liberdade.